11 de agosto de 2014

Protegidos define enredo 2015

A escola de samba Os Protegidos da Princesa divulgou nesta segunda-feira, dia 11 de agosto, o enredo para o carnaval 2015. A agremiação mais vezes campeã do carnaval de Florianópolis e vencedora em 2014, irá retratar os 100 anos da Associação Industrial e Comercial de Florianópolis (ACIF).

Com o título “Emoldurada pelo mar, uma história que me representa – Crônica de uma cidade em transformação”, o enredo faz uma celebração do centenário desta entidade, cuja história se confunde com a história de nossa cidade. A escola buscará o bicampeonato e contará na avenida o desenvolvimento urbano de Florianópolis, do antigo porto aos caminhos para o futuro. 

Abaixo, a sinopse é narrada por um personagem especial da escola:

EMOLDURADA PELO MAR, UMA HISTÓRIA QUE ME REPRESENTA
CRÔNICA DE UMA CIDADE EM TRANSFORMAÇÃO

Florianópolis, 15 de fevereiro de 2015.

Meus filhos e minhas filhas,

Quando a gente olha pra trás, começa a perceber o mundaréu de coisas que foram se erguendo neste pedacinho de terra perdido no mar. Aquele porto rodeado de umas ruazinhas, uma praça e uns pingados de casas que existia cem anos atrás, hoje é um infinito de prédios gigantes, um vai-e-vem incansável, o asfalto cortando o verde.

Antigamente, também tinha um ir e vir que deixava a cidade num rebuliço só, mas era muito diferente. Logo de manhãzinha, quando o sol se espreguiçava por trás do Mocotó e batia nas pedras de Itaguaçu, já se via o pescador indo colher os frutos do mar e a rendeira bordando com o bilro e contando histórias. Papai trabalhava no porto, era estivador e contava que era assim desde sempre. No mar que leva e traz, que guarda histórias, lendas e segredos, frutificavam as riquezas e acontecia a história da nossa cidade.

Lembro bem de quando fui morar com minha família de criação, num hotel ali na Rua Victor Meirelles. Era por essa hora da manhã que a gente descia pela Praça XV e via as quitandeiras numa gritaria vendendo de tudo. No Mercado, o pescador chegava com o peixe fresquinho e mais adiante a Rua do Comércio vendia os melhores tecidos, secos e molhados, calçados, joias e tudo mais que a gente quisesse. De longe, já se ouvia o barulho da Alfândega: era caixa pra lá, balança pra cá. 

O movimento era tanto que criaram uma Associação para o progresso chegar mais rápido. O porto fervia de gente e mercadoria que chegava e saía, desde que o Seu Carl Hoepcke, homem importante daquela época, começou a mexer com navio e montar fábrica de tudo quanto era coisa: ponta, gelo, renda e bordado. Antônio, de tanto trabalhar no mar, sempre que via um desses bordados dizia que parecia a espuma na beira d’água.

Ainda era muito menina quando toda a gente precisava pegar barco sempre que atravessava da ilha para o continente. Viver aqui era estar meio preso na ilha. Quando bordaram uma ponte de aço abrindo caminho para o progresso, pensaram em chamar de Ponte da Independência, com toda razão. A comida preferida dos trabalhadores era o mocotó do morro da nossa escola, que acabou ficando conhecido pelo nome da comida. O governador da época não aguentou a tempo da inauguração – chegaram a fazer uma ponte de madeira perto do trapiche pra ele inaugurar, com direito a discurso, fanfarra e foguetório na praça – e deram o nome dele: Hercílio Luz. Muitos anos mais tarde, deixaram o caminho de ferro todo iluminado e o nome ficou muito bonito.

O porto ainda durou algumas décadas e trouxe muita coisa boa pra cidade. Era burburinho de notícias e novidades. Foi com um grupo de marinheiros que começou a nossa escola, que ajudei a dar vida e vocês têm que fazer ser eterna. A Protegidos da Princesa começou ali na Rua Major Costa, na casa do Libânio, nas bananeiras do Libânio. Ali começaram a conversar, embaixo das bananeiras e fundaram “Os Protegidos da Princesa”. Só tinha homem, não tinha mulher nessa época. E eu morava ali na Caixa D’Água, ali nos fundos, passava pela casa do Libânio e a gente já começou a enfrentar o batuque dos rapazes... 

Com a ponte, a vida foi mudando e a cidade foi crescendo. Veio banco, fábrica de tecido e as coisas do mar ganharam outra importância. A pesca cresceu e as criações de ostras passaram a fazer a vida de muita gente. O banho de mar que era um luxo nas praias de Coqueiros, Bom Abrigo e Estreito, começou a trazer gente para conhecer as belezas da ilha e fazer o veraneio por aqui. Muitos foram ficando, porque a ilha é como coração de mãe, sempre cabe mais um.

Florianópolis foi crescendo e ganhou duas universidades. E pensar que na minha época era tão raro ver um doutor, hoje em dia vem gente estudada de todo o mundo trabalhar por aqui. É o tal do progresso, tecnologia, fazem até aquelas máquinas que a gente que é mais antigo tem dificuldade de entender, umas geringonças que dão certo. A cidade cresceu tanto que tiveram que fazer mais pontes de tanto carro que entra e sai! Onde era o campo de futebol em que os rapazes lá da minha pensão jogavam o campeonato profissional, fizeram o primeiro shopping da cidade, coisa tão fina que depois vieram outros! E o aeroporto, que começou como um simples campo de pouso, agora é internacional, coisa chique por essas bandas!

Eu vi essa cidade crescer e começo a pensar que ela não é de nenhum de nós. Já deixei vocês há algum tempo e vocês um dia vão deixar essa cidade para seus filhos e netos. Então, pensem bem no futuro. Minha alma se enche de esperança quando vejo gente lutando pela preservação. Lá na Lagoa, até o óleo de cozinha já é reciclado e tem muitos sonhadores pensando em trazer de volta a cidade com gente que chega pelo mar. 

Continuem construindo nossa cidade geração após geração, sem esquecer de preservar a história, as tradições e a natureza. E, quando puderem, mandem notícias, porque aqui em cima também bate uma saudade. Não esqueçam desta velha mãe que ama muito todos vocês.

Com carinho,
Didi

JUSTIFICATIVA

O desfile de escola de samba é uma grande celebração, um espetáculo festivo a céu aberto, cujos diversos elementos plásticos, musicais e performáticos compõem uma narrativa. Nosso carnaval de 2015 será parte das celebrações pelo centenário da Associação Comercial e Industrial de Florianópolis (ACIF). Desta parceria, nasceu o questionamento: por quais transformações Florianópolis passou nos últimos cem anos?

Certamente, foram incontáveis. Durante nossa pesquisa, constatamos que a história da ACIF é indissociável da história do desenvolvimento urbano de Florianópolis: seu passado, seu presente e seus projetos para o futuro. A antiga cidadela portuária se transformou em um emaranhado de progresso que busca um caminho sustentável para seus próximos passos. É esta a história que iremos contar: Florianópolis é uma cidade em transformação.

Nosso desfile será uma crônica, tendo Dona Didi, a matriarca da Protegidos da Princesa, como narradora. Sua figura é evocada pois sua trajetória é permeada pelos caminhos que o enredo percorrerá, condizendo com a leitura artística pretendida. Filha e esposa de estivadores, ouvia desde pequena as histórias da Florianópolis portuária, que chegou a vivenciar durante a infância. Durante sua vida, foi testemunha do desenvolvimento urbano da cidade e, agora, do céu, maternalmente, olha por seus “filhos” para que construam para Florianópolis um futuro tão belo quanto sua história.

É contando essa história, com uma narrativa consistente, que permite o desenvolvimento artístico da escola de samba em sua plenitude, que entraremos na avenida sonhando com o bicampeonato em 2015!

AOS COMPOSITORES

Este enredo sugere um samba interpretativo, ou seja, “que conta o enredo sem fixar-se em detalhes, mas contendo implicitamente a ideia e o espírito das principais passagens do enredo”. Seguir esta linha não é uma obrigatoriedade ou limitação, mas uma sugestão artística que consideramos conveniente.

O desfile será dividido nos seguintes quadros: “O homem e as riquezas do mar”, “Florianópolis portuária”, “Uma cidade em expansão” e “Engrenagem do futuro”, que correspondem à sequência narrativa apresentada na sinopse. Não é necessário citar nominalmente estes quadros, tampouco dividir o samba rigidamente entre eles, apenas pedimos para lembrar de sua ideia e espírito durante a composição.

Dona Didi é a narradora do enredo, mas o enredo não é sua biografia e não iremos contar sua história na avenida. A letra do samba pode ser composta em primeira, segunda ou terceira pessoa, cabendo aos compositores utilizar seu tino criativo nesta escolha. Não há limites de número de versos ou padrões a serem seguidos. Confiamos em seu bom gosto musical!

Surpreendam e emocionem! Muita inspiração a todos e boa sorte!